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Quais serão os impactos da guerra nos custos das empresas brasileiras?

Preocupação com fertilizantes é apenas uma face da moeda. Petróleo pressiona preços, mas é preciso olhar também a variação do câmbio e o clima, que ano passado não colaborou, avaliam profissionais que vivem o dia a dia das atividades da agricultura e pecuária no país.

É consenso no setor que o fornecimento de fertilizantes aflige, já que só ano passado, 26% do que foi gasto com o insumo para atender o agronegócio brasileiro foi de negociação com a Belarus (3%) e a Rússia (23%), de acordo com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). O primeiro país apoia incondicionalmente o segundo na guerra contra a Ucrânia.

As sanções de americanos e europeus impostas a ambas nações colocam o Brasil numa condição desconfortável para um produto essencial para o setor, que responde por mais de um quarto do PIB nacional.

Outra preocupação de representantes do agronegócio é o preço do combustível, que tem oscilado com tendência de alta. Da composição do custo operacional do transporte rodoviário, 35% é com o diesel; enquanto na navegação gira entre 40% e 50% do frete marítimo, segundo a confederação do setor.

“Tudo isso vai provocando uma escalada de preços”, diz Reginaldo Minaré, diretor-técnico da CNA. Questionado se as empresas agrícolas terão menor rentabilidade, Eduardo Daher, diretor-executivo da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), diz que sim.

Mas não acredita em prejuízo, porque as commodities estão em valor elevado: “Mas vão ter que conviver com a inflação”, completou.

Raphael Mandarino, diretor da AgResource Brasil, consultoria do mercado agrícola, afirma que o conflito serviu como catalizador da perspectiva de alta. “A gente já vem de um superciclo de commodities que deve durar de dois a três anos ainda. E é obvio que a perspectiva de alta da energia – no caso, o petróleo – acaba também puxando todas as outras”, diz.

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Não se sabe quanto tem de estoque de fertilizantes

No caso do fornecimento de fertilizantes, que tanto preocupa o Brasil, o potássio vem de Belarus, ao passo que da Rússia desembarcam potássio, nitrogenados e fósforo.

“Para esse semestre, o produtor já havia comprado e as empresas já tinham até importado. Para o segundo semestre, especialmente de outubro em diante, com a maior safra na virada do ano, aí terá que ter esse fluxo chegando”, explica Reginaldo Minaré. Para o diretor da CNA, “os grãos tem um calendário mais exigente de fertilizantes”.

Conforme Eduardo Daher, não se tem a ideia exata de quanto existe de fertilizantes em estoque, mas o problema virá se a crise entre a Rússia e Ucrânia se alongar.

“Fala-se até outubro, mas é certo otimismo. Acho que não tem. Mas dizem também que teria somente para três meses – mas tem pessimismo aí. Estoque de passagem não é só o que tem nas fábricas, mas na fazenda, nas revendas, cooperativas, armazéns em portos e navios em trânsito”, analisa, afirmando ser difícil quantificar.

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Explorar potássio é um grande desafio

Segundo Daher, “existe um catastrofismo em torno do fertilizante”. Para o diretor-executivo da Abag, o problema maior é o potássio. O fosfato, por exemplo, o Brasil já produz 50% do que usa; e os fertilizantes nitrogenados, nem toda cultura a aplica, como o caso da soja.

“Para esse ano e para o próximo, o incremento da produção nacional de fertilizantes não é a solução. Depende de pesquisa e investimentos de longo prazo, ajuste normativo. Potássio é mais difícil porque ele em geral está a 800, mil metros de profundidade no Brasil”, afirma Minaré, complementado que o País produz muito pouco do importante insumo.

“O maior produtor de potássio é o Canadá. O país sempre forneceu ao Brasil, mas a Rússia veio nos últimos tempos com preços competitivos. A questão é que os Estados Unidos também quer o potássio do Canadá”, diz Daher, que crê no potássio mais caro, mas que existem alternativas à Rússia e Belarus para aquisição do produto.

Para Mandarino, as perdas registradas no ano passado na safra no Brasil por conta da seca e do calor na região centro-sul, “empurra toda uma demanda mundial de volta para os Estados Unidos, como da soja”. E isso é um fato de pressão nos preços, além do problema na Ucrânia, que é um importante exportador de grãos.

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O diretor-executivo da Abag crê que os custos da produção no Brasil e no mundo estarão invariavelmente mais caros. “Já existia um encarecimento do fertilizante por conta da pandemia. O mundo estava pedindo mais alimentos. O mundo vinha batendo recordes para dar alimento e fazer divisas. Qual a consequência disso? A inflação”, analisa.

O diretor da CNA alerta, porém, para um possível fomento do governo à produção nacional de fertilizantes com a taxação do produto importado: “Precisa fazer florescer essa indústria nacional de forma competitiva. Quando você taxa o importado, você vai pagar mais caro por esse fertilizante”.

Ele ainda sugeriu que o mercado agrícola olhasse com mais atenção para os países da África com relação aos fertilizantes. O Marrocos tem a maior reserva conhecida do mundo de fosfato, e já exporta para o Brasil, e a Etiópia possui enormes reservas de potássio, com facilidade de extração, já que estão em torno de 40 metros de profundidade. “A solução a curto prazo é fazer diplomacia comercial”, diz.

Gestão mais efetiva dos custos para ganhar margem

Não há dúvida que em um cenário tão desafiador, as empresas do agronegócio terão que buscar soluções para cortar custos e manter as margens.

Raphael Mandarino, da AgResource, propõe foco na gestão do solo. Já Eduardo Daher, da Abag, aponta que é preciso olhar mais o clima e o câmbio, porque o agricultor não consegue controlar esses dois fatores.

“Ele pode controlar tecnologia, custo, cálculo de relação de troca, pôr menos adubo”, diz.

“Mas ele vai rezar pelo clima. O câmbio ele planta num valor e colhe com outro. O dólar está hoje em torno de 5 reais e quando colher com certeza não vai estar isso. Essa variável é importante a gente saber por que está sendo volátil”, disse.

Petróleo coloca mais pressão

O petróleo é um dos principais motores da perspectiva inflacionária, diz Mandarino. “O petróleo afeta a perspectiva de logística, de produção e de commodities porque ele tem relação direta com tudo isso”, afirma o diretor da AgResources. E a Rússia, envolvida no conflito com a Ucrânia, é uma das maiores produtoras de petróleo do mundo.

Segundo ele, é essencial estudar ainda a fundo a matriz energética e seu impacto, mas lembra que o biocombustível, considerado uma alternativa ao petróleo, compete com a produção de alimentos.

“Os preços (do petróleo) já estavam em processo de elevação desde 2021. Mas o impacto da guerra no preço dos combustíveis ele não está ainda precificado”, analisa Reginaldo Minaré.

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Logística ameaçada, bloqueio financeiro e commodities em alta

Eduardo Daher menciona que haverá dificuldades também na logística porque ele não vê um armador querendo colocar em risco seu navio em áreas de conflito – por exemplo, para ir buscar fertilizantes na Rússia.

O bloqueio financeiro realizado por meio da suspensão a bancos da Rússia do sistema de pagamento Swift, que padroniza as operações comerciais entre países nos negócios internacionais, é outro embaraço.

“O comércio é feito por trade. Isso vai ter impacto, custo mais elevado. Essa dificuldade de recebimento e entrega é um desafio”, analisa Reginaldo Minaré. “De forma franca, esse volume de sanções é único na história desse porte e intensidade. Não temos literatura para isso.”

O diretor executivo da Abag vê impacto possível em toda a cadeia de produção com o conflito. “Cerca de 70% do milho vai para ração de frango, suíno e menor intensidade na carne bovino”, cita Daher, comentando que o trigo e o milho chegaram a subir a preços proibitivos nas bolsas de cotação de commodities do exterior nos últimos dias.

“Os estoques estão muito baixos, e são muito fortes os fundamentos de os preços de commodities se manterem elevados”, acrescenta Raphael Mandarino.

Eduardo Daher afirma que o preço final ao consumidor não será sentido de imediato, “mas haverá processo inflacionário, por certo”. Ele não tem dúvida que haverá encarecimento da produção agrícola antes da porteira.

Veja a visão da XP para as empresas listadas no conflito

Bebidas

Para a XP, são esperadas pressões de custos sobre as margens da Ambev (ABEV3) neste ano. A própria empresa informou na última divulgação de resultados uma previsão de elevação do custo caixa entre 16% e 19%, o que foi considerado, porém, “muito otimista à luz dos acontecimentos recentes”, diz a XP.

“Em nossa opinião, os impactos da inflação causados pela crise Ucrânia/Rússia podem impactar ainda mais as margens em 2023 devido à estratégia de hedge de 12 meses da Ambev”, escreveram.

Alimentos

Da área de alimentos, a empresa que deverá ser mais afetada é BRF (BRFS3), devido à sua exposição aos preços da soja e do milho, pois 45,3% do CPV da empresa teve exposição a essas commodities em 2021, diz a XP, já que um aumento de 5% nos preços do milho e da soja afetaria negativamente o Ebitda em 12% em 2022.

Por outro lado, a corretora ressalta que a Marfrig (MRFG3) seria a melhor posição defensiva no cenário atual, já que 88% de sua receita já está em dólares em 2022.

Enquanto isso, há um impacto limitado à JBS (JBSS3), pois a Seara representa apenas 9% do CPV consolidado, pela diversificação geográfica e de proteínas.

Açúcar e Etanol

Neste segmento, a XP não espera não haver grandes impactos negativos aos players de açúcar e etanol, pois já estava na conta os custos mais altos de fertilizantes às empresas neste temporada.

No mais, com o petróleo acima de US$100/barril, os preços da gasolina devem seguir em alta e abrirão espaço para uma valorização do etanol no mercado interno, levando as usinas a se focarem na produção de combustível, enquanto a posição do açúcar está protegida em níveis elevados.

“Um aumento de 5% na taxa de câmbio (US$/R$) juntamente com um aumento adicional de 10% nos preços do etanol elevaria o EBITDA da Jalles Machado (JALL3) e da São Martinho (SMTO3) em 8,1%, em média, em 2022.

Grãos

Com a crise Ucrânia/Rússia elevando os preços das commodities, há uma perspectiva positiva para os produtores, embora estejam previstas ampliações de custos, pressionando as margens.

“Essa pressão será sentida em todo o mundo, de modo que os agricultores brasileiros serão favorecidos devido a um custo de produção estruturalmente menor”, destaca a XP.

Conforme a corretora, BrasilAgro (AGRO3) está bem-posicionada para aproveitar o momento positivo dos preços das commodities, já que um aumento de 5% nos preços da soja e do milho elevaria o seu Ebitda em 4% em 2022.

Por fim, a XP avalia impacto limitado para Boa Safra (SOJA3) e Agrogalaxy (AGXY3), embora ainda em um ambiente positivo.

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Por: Rodrigo Petry – InfoMoney

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