A semana foi agitada para o petróleo. E, se no começo dela, a expectativa era de avanços nas cotações dos principais contratos da commodity com as restrições ao petróleo russo, com a manutenção do ritmo de cortes de produção pela Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+) e com as notícias de reabertura da China, ao longo da semana o que vimos foi uma sequência de queda para os preços do petróleo.
O contrato futuro do brent para fevereiro caiu 11% na semana, assim como o WTI para janeiro, o pior período em meses, com as preocupações sobre as maiores economias do mundo se sobrepondo às notícias anteriores que poderiam puxar o petróleo para cima.
Ricardo Kazan, gestor de commodities da Legacy Capital, que tem uma tese de alta do petróleo, destacou como as restrições russas poderiam afetar o mercado e explicou como elas funcionam.
“Lá atrás, quando começou a guerra da Ucrânia, a União Europeia aprovou uma sanção que passou a valer desde o último dia 5 de dezembro, que a Europa não poderia mais importar petróleo russo por mar”, apontou.
Além disso, existe um oligopólio no serviço de seguro, resseguro e navegação de petróleo no mundo que acontece entre Europa e Inglaterra e os donos dos navios de transporte são os armadores gregos. “Eles também não vão mais prestar serviços nem de seguro, nem de resseguro e nem de transporte”, aponta.
Contudo, a projeção desses embargos deixou os EUA com receio dos possíveis impactos para os preços mundiais do petróleo.
Assim, os americanos propuseram um limite para o preço do petróleo bruto russo transportado por via marítima. Com isso, foi aprovado o teto de preços de US$ 60 para a Rússia pelo G7, que reúne, além de três países-membros da União Europeia (Alemanha, França e Itália), os Estados Unidos, o Canadá, o Reino Unido e o Japão.
Com isso, caso alguém compre o petróleo russo abaixo ou até esse valor que foi estabelecido, os países que fazem o seguro podem prestar esse serviço. “Então. essas sanções apontam que, se não for comprada a commodity russa por esse determinado valor, não haverá acesso a seguro, resseguro e navegação”, ressalta Kazan.
O limite visa assim uma punição ao presidente russo Vladimir Putin, mas que as exportações de petróleo russo continuem a fluir para os mercados globais. Contudo, cabe ressaltar, os países-membros da União Europeia não serão autorizados a comprar petróleo da Rússia por via marítima mesmo que o preço seja de até US$ 60 por barril, pois o embargo do bloco está acima do limite de preço do G7.
Com isso, o efeito esperado é que parte do petróleo russo que iria para o bloco, de 500 mil barris por dia, teria que ser realocada para outro lugar, ao mesmo tempo em são gerados problemas operacionais para os navios de transporte, afetando as rotas logísticas, avalia o gestor, o que levaria a uma pressão para cima para os preços da commodity. Cabe destacar que a Rússia reagiu e afirmou que não venderá petróleo sujeito a um teto de preço imposto pelo ocidente, mesmo que isso signifique cortar a produção.
A princípio, porém, essas medidas não deveriam causar um impacto forte na economia russa, uma vez que o país já vende atualmente boa parte de seu petróleo bruto a esse preço-teto. O que pode ocorrer é uma limitação dos lucros caso os preços voltem a subir. A Rússia também realocou já uma boa parte da produção para os mercados como de China e Índia, por exemplo, uma vez que a Europa já tinha reduzido a importação do petróleo do país nos últimos meses. Porém, esse teto deve ser reajustado a cada dois meses, enquanto o poder de barganha dos países que que agora estão importando a commodity do país pode aumentar por conta desse preço-teto.
Em nota para clientes, analistas do Deutsche Bank apontaram “ver um risco de oferta moderado em torno do embargo de petróleo da União Europeia e do limite de preço do petróleo, pois os interesses dos compradores asiáticos estão alinhados com as necessidades fiscais da Rússia, o que limita o risco de redução deliberada de oferta por Moscou”.
Enquanto os investidores ponderavam os impactos dos anúncios de restrição da Rússia também para a oferta, a perspectiva de desaceleração econômica global fez com que os preços do petróleo sofressem nas últimas sessões, voltando a níveis abaixo do pré-guerra da Ucrânia.
Na segunda-feira, foram divulgados dados fortes do setor de serviços da economia americana. Se em um primeiro momento isso seria positivo, por indicar que os EUA estão com a economia forte, por outro reforçaram a visão já do final da semana anterior de que o Federal Reserve deve seguir com um forte aperto monetário e que, a depender da dose, uma recessão na maior economia do mundo se avizinha.
Na terça-feira, os preços do petróleo voltaram aos níveis pré-crise na Ucrânia, com o brent abaixo de US$ 80 o barril pela primeira vez em 2022. Segundo Matt Smith, analista de petróleo da Kpler, a decisão da Opep+ de não acelerar mais os cortes de produção como tinha sido especulado, o início sem força das restrições para a Rússia e a queda dos mercados acionários impactaram o mercado petroleiro.
No meio da semana, no intraday, os preços chegaram a subir com a notícia de que TC Energy do Canadá havia fechado o oleoduto Keystone de 622 mil barris por dia, que é a principal linha de transporte de petróleo pesado canadense de Alberta para o Meio-Oeste dos EUA e a costa do Golfo, após um vazamento em um riacho do Kansas. Porém, a perspectiva de retomada em breve logo fizeram os preços da commodity voltarem a cair.
Na sexta, o petróleo voltou a renovar as mínimas do ano, com o aumento ligeiramente acima do esperado nos preços ao produtor dos EUA em novembro e notícias de um reinício parcial no Keystone Pipeline pressionando mais uma vez.
Projeções: futuro não é tão negativo
Ao olhar para a curva futura do petróleo, o Bradesco BBI destaca que o mercado está antecipando uma recessão no próximo ano, o que deve levar a um excesso de oferta de curto prazo nos mercados físicos e a um acúmulo de estoques comerciais. Ao fazer um um “check-up” geral dos fundamentos do petróleo, contudo, o BBI viu um mercado saudável e ainda aponta que, à medida que os preços do WTI se aproximam de US$ 70 o barril, isso pode levar os EUA a começarem a reconstruir sua reserva estratégica de petróleo, o que pode ser uma boa oportunidade para aumentar o posicionamento em nomes do setor.
“No médio prazo, os preços podem continuar pressionados devido aos temores de uma recessão e mais aumentos de juros pelo Fed. Mas, à medida que o Fed começa a sinalizar o fim do ciclo de alta dos juros, juntamente com a reabertura gradual da China, acreditamos que os fundamentos começarão a se impor e elevar os preços”, avalia.
Roberto Ardenghy, presidente do Instituto Brasileiro Petróleo (IBP), aponta que, mesmo com a queda recente dos preços, as projeções para o petróleo seguem sendo de restrição de oferta para 2023 e para os próximos anos. “A Rússia continua sendo um player importante na produção de petróleo e outros combustíveis e está, pouco a pouco, saindo do mercado”, pressionando os preços, avalia o especialista.
Além disso, vê um cenário de restrição de oferta porque projetos no setor de óleo e gás não estarem sendo realizados, seja por motivo de custo, com aumento dos gastos por conta da questão logística mundial, quanto pela redução nos volumes de investimentos um pouco condicionado pela questão da transição energética. Investidores estão receosos de investir em um setor que pode ver sua importância caindo nos próximos anos.
Ardenghy aponta ainda que, nos últimos dez anos, houve duas baixas significativas do preço do petróleo, em determinados momentos, o que aumenta a resistência sobre futuros investimentos no setor.
“Com isso, podemos antecipar um cenário de restrição de oferta, com o preço do barril impulsionado por esse cenário. Quando não há reposição dos investimentos, há declínio da produção”, aponta.
Além disso, em todos os cenários, ainda há um aumento do consumo de petróleo nos próximos anos. Há projeções da Agência Internacional de Energia que vê que o consumo pode saltar de 99 milhões de barris por dia a até 108 milhões de barris nos próximos anos.
“Em um cenário de aumento de consumo, com restrição de oferta, há impacto direto nos preços. Mesmo com as recentes quedas, a Agência de Informação de Energia dos EUA projeta o preço do barril em US$ 93 ou US$ 94 em 2023. A agência internacional vê entre US$ 80 ou US$ 85”, avalia.
O JPMorgan, em relatório de projeções, apontou esperar um brent em média de US$ 90 o barril para 2023 e de US$ 98 em 2024. “Ao contrário de março deste ano, quando nossa previsão para 2022 e 2023 estava abaixo do consenso porque
esperava maior oferta russa e menor demanda, nossos números para 2023 e 2024 estão bem acima da curva futura”, avalia.
Para os analistas de petróleo, mesmo com a economia global devendo desacelerar em 2023, há fortes razões para esperar um crescimento da demanda relativamente robusto, de 1,3 milhão de barris por dia (mbd), no próximo ano, já que a demanda de petróleo ainda será impulsionada pela normalização contínua dos serviços e, assim, apoiar os combustíveis por conta da maior mobilidade (gasolina e diesel).
O JP também avalia que a dinâmica de reservas estratégicas nos EUA também se tornará mais favorável em 2023 e 2024, com o país devendo reabastecer os seus estoques na primeira metade de 2023.
“A nossa previsão de US$ 90 o brent em 2023 se baseia na visão de que a Opep+ fará o trabalho pesado para manter os mercados equilibrados no próximo ano. Nós esperamos que a oferta cresça 30% acima do ritmo da demanda em 2023, conforme a produção da Rússia se normaliza totalmente e uma combinação de projetos fornecendo uma oferta adicional de 1,6 mbd. Para manter os mercados em equilíbrio, a Opep+ precisa cortar mais 0,4 mbd acima de sua cota de outubro”, avalia o banco.
Do lado estrutural, o crescimento da oferta global deverá desacelerar em 2024, reacendo a necessidade de quase 1 mbd de petróleo da Opep. O crescimento dos produtores de xisto dos EUA, tradicionalmente os mais receptivos às mudanças de
condições de mercado, deve cair para mais da metade, passando de 1,1-1,2 mbd neste ano para próximo a 0,5 mbd em 2024.
Além disso, a produção não-Opep+ e não-EUA provavelmente passará de uma taxa de crescimento de 0,9 mbd em 2023 para uma contração de 0,08 mbd em 2024, abrindo o caminho da Opep+ para preencher grande parte da lacuna de oferta de 1 mbd. “No entanto, não esperamos que a aliança explore sua capacidade ociosa muito além dos níveis alcançados em meados de 2022”, avalia o JP.
No podcast Stock Pickers, Kazan, da Legacy, destacou os pontos por trás de sua visão otimista para os preços do petróleo: baixos níveis de estoque; falta de capacidade ociosa; encerramento da venda de reserva estratégica pelos EUA e uma possível recompra de reservas; riscos geopolíticos em iminência, com a Rússia sendo um dos maiores produtores de petróleo no mundo e
China em processo de reabertura. Confira abaixo o programa completo:
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Por: Lara Rizério – InfoMoney